O melhor do Festival de Veneza até agora…
Eis os filmes imperdíveis da seleção veneziana de 2018


Rodrigo Fonseca
Nada que se viu no Lido de quarta-feira pra cá tem o mesmo vigor estético de “ROMA”, um experimento memorialista de Alfonso Cuarón no qual o diretor de “Gravidade’ (2013) dá voz e vez à sua verve autoral mais ousada, narrando a crise de uma família de classe média nos anos 1970. Seu foco: o olhar de uma empregada ameríndia que vê aquele clã penar pra ficar de pé. É o favorito absoluto ao Leão de Ouro. Mas tem mais coisa boa por aqui pelo Festival de Veneza.
Eis melhor de terra da gôndola até agora:
La Noche de 12 Años, de Alvaro Brechner: O diretor de “Sr. Kaplan” (2014) viaja aos anos de chumbo do Uruguai para relatar o calvário do jovem Pepe Mujica, com Antonio de la Torre, um dos atores preferidos de Almodóvar, no papel do (futuro) ex-estadista latino. Sua montagem potencializa o clima de tensão sem comprometer o distanciamento crítico;
Nasce uma Estrela, de Bradley Cooper: Quem diria que o galã mais badalado da primeira metade desta década é um cineasta dos mais bem preparados? Eastwoodiano até a medula, com ecos do que o astro aprendeu filmando “Sniper americano” (2014), este drama de amor mostra que Lady Gaga é muito mais do que uma voz pop. Ah! E tem Sam Elliott, um gênio que Hollywood só passou a valorizar agora;
Deslembro, de Flavia Castro: Uma surpresa latina na competição Horizontes, estruturada como um inventário de cicatrizes da ditadura. A documentarista aclamada mundialmente por “Diário de uma busca” (2010) estreia na ficção atraindo a atenção dos jornalistas da Europa pela delicadeza com que retrata traumas políticos. O desempenho de Sara Antunes na pele de uma jovem mãe abalada por perdas afetivas foi elogiado em múltiplas línguas;
Non-Fiction, de Olivier Assayas: Sem perder a elegância que marca seu modo de exercitar as cartilhas de gênero, o premiado diretor de “Personal shopper” (2016) investe no humor, com resultados surpreendentes, abordando conflitos e vaidades do mercado editorial francês. Guillaume Canet, galã e cineasta, ajuda a valorizar a delicada escrita dramatúrgica de Assayas num roteiro de diálogos ferinos sobre um editor às voltas com neuroses do mundo digital;
Amanda, de Mikhaël Hers: Apoiado no talento do ator Vincent Lacoste, o diretor de “Memory Lane” (2010) faz um libelo sobre a reinvenção afetiva a partir do drama de um parisiense que se vê obrigado a cuidar de sua sobrinha após uma tragédia pessoal;
The Great Buster – A Celebration, de Peter Bogdanovich: Ao passar em revista a trajetória de gargalhadas e de aventuras autorais de Joseph Frank “Buster” Keaton (1895-1966), um dos gênios do riso na era muda, o realizador de “A última sessão de cinema” (1971) prova ser um documentarista antenado com as estéticas do presente. Mesmo só falando do passado…Com uma montagem vertiginosa, o filme é uma comovente carta de amor à cinefilia;
Peterloo, de Mike Leigh: Laureado com o Leão de Ouro em 2004 com “Vera Drake”, o bruxo do naturalismo britânico expôs as entranhas políticas de sua pátria ao revisitar o massacre que sujou as ruas de Manchester de sangue, em 1819, por decisão da aristocracia inglesa, a fim de evitar algo similar à Revolução Francesa em suas terras. O resultado é um épico cru, que atomiza protagonismos. A História é a estrela.