Um Espião e Meio
Espião letal com problemas de autoestima e afeição a unicórnios
Bullying é um dos temas mais abordados do cinema americano, em qualquer gênero de filme, do drama ao terror. Por que não misturar os gêneros, então, e conseguir uma comédia de ação com pitadas de espionagem em “Um Espião e Meio” (“Central Intelligence” no original)? E, de quebra, ainda conquista o espectador com o enorme carisma de seu protagonista, o mais improvável e insuspeito alvo para sofrer bullying, Dwayne “The Rock” Johnson (franquia “Velozes e Furiosos”). O gigante ator em altura e músculos intimida só pela sua presença, mas a produção do filme e seu diretor Rawson Marshall Thurber foram espertos em demonstrar onde as vítimas deste mal moderno mais sofrem: no psicológico. Para isso, transforma por computação gráfica o rosto do ator emparelhado a um corpo obeso na juventude para sofrer um trauma que o fará se exercitar até alcançar o corpo que possui, e virar um dos espiões mais letais do mundo, ainda que frágil e ingênuo psicologicamente devido a nunca ter tido amigos pela baixa autoestima.

Este é o ponto de partida para acrescentar o lado cômico através da contraparte a protagonizar o longa-metragem, o comediante Kevin Hart (“Todo Mundo em Pânico 3”), que era o aluno mais popular da escola e o único a ter demonstrado solidariedade ao personagem de Dwayne quando ainda era obeso e perseguido. Agora, logo chegando perto da famigerada data de reunião de formandos do colégio anos depois, ele se sente um fracassado perito de contabilidade, mesmo casado com a mulher que ama, a quem morre de medo de decepcionar. E será em meio às desventuras de espionagem do pseudoamigo que confundiu aquele ato de solidariedade com intimidade, que os dois personagens encontrarão sua autoestima de volta, com direito à paródia de sessão conjunta de psicanálise.

De fato o espectador poderá se envolver e se divertir com o espírito de aventura bem intencionado a parodiar o estilo “odd couple”, ou seja, duplas estranhas da história do cinema, que deu tão certo em exemplos como “MIB – Homens de Preto”, mas que aqui sofre um bocado com o contraste não tão harmonioso entre o histrionismo de Kevin e o propositalmente sisudo Dwayne. Até porque Dwayne consegue superar a dicotomia e entregar seu personagem bem mais tridimensionalizado, dentre a gama de frágil a ameaçador, de modo que a trama se torna mais imprevisível com ele em cena. É um homem capaz de amar unicórnios e usar uma pochete, mas ao mesmo tempo de talvez trair o governo americano em prol de um bem maior… Ou será? Tudo isso é crédito de um ator que anda crescendo em maturação do seu carisma, sabendo suas limitações. Por outro lado, o mesmo não pode ser dito da persona criada por Kevin, unidimensional até o final, especialmente pela narrativa teimar em focar nele por mais tempo em cena.

As sequências de ação não possuem grandes inovações, porém até que são superiores ao de costume quando embutidas em filmes de comédia. Com destaque para o confronto no trabalho de escritório asséptico de contabilidade em meio ao tiroteio de agentes da CIA, e o conflito final com participação especial de um ator notabilizado por Breaking Bad. A trilha sonora dos anos noventa também diverte, só pena que é abandonada em termos de tentar criar uma associação na escolha dos artistas musicais como estão agora em suas carreiras, caso fossem escolhidas músicas representativas do passar do tempo. E os coadjuvantes são nulos ou rasos, ressalvando-se apenas a agente interpretada por Amy Ryan.

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